Se a proposta for aprovada, categoria deixará
de ter direito a uma idade diferenciada e passará a seguir regras impostas a
outros trabalhadores
Por Nairim Bernardo
A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 287,
que prevê a Reforma da Previdência, coordenada pelo ministro-chefe da Casa
Civil, Eliseu Padilha, foi enviada para o Congresso Nacional. Ao contrário do
que se especulava, ela prevê a extinção das aposentadorias especiais. A idade
para educadores e educadoras se aposentarem pode, então, ser igualada em 65
anos, assim como a dos outros trabalhadores (com exceção dos militares).
Professores que até a data de promulgação da emenda tenham 50 anos ou mais e
professoras com 45 anos ou mais poderão se aposentar após cumpridos 30 anos de
contribuição, se homem, e 25 anos no caso das mulheres (desde que tenha
cumprido um período adicional equivalente à metade do tempo que faltaria para
atingir o tempo de contribuição anterior).
O intuito do governo federal é que mudanças nas
regras de aposentadoria ajudem a diminuir os gastos públicos. No orçamento
previsto para 2017, 562,4 bilhões de reais deverão ser usados em despesas
correspondentes a gastos com pagamentos desse benefício trabalhista, bem como
pensões e auxílios de trabalhadores e empregadores. O déficit esperado para o
Regime Geral da Previdência (conhecido através do INSS) é de cerca de 181,2
bilhões de reais, segundo o Projeto de Lei Orçamentária Anual, divulgado pelo
Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão.
Atualmente, trabalhadores do setor público e
privado podem se aposentar com, no mínimo, 65 anos para homens e 60 para
mulheres, ou por tempo de contribuição, 35 anos para homens e 30 para mulheres se
esse valor, somado à idade da pessoa, corresponder a 85 e 95, respectivamente.
Caso a proposta seja aprovada, só será possível parar de trabalhar após atingir
a idade mínima de 65 anos. Além disso, o tempo mínimo de contribuição para a
Previdência Social passará de 15 para 25 anos.
Até o momento, professores de Educação
Infantil, Ensino Fundamental e Médio, policiais federais e civis dos Estados e
cargos que se expõem a agentes nocivos à saúde têm direito à chamada
aposentadoria especial. Essa separação decorre de o fato de tais profissionais
estarem expostos a trabalhos mais desgastantes ou arriscados. No caso dos
docentes, a idade mínima é de 55 anos para homens e de 50 para mulheres. Já o
tempo de contribuição mínimo para homens e mulheres é de 30 e 25 anos,
respectivamente. Essa regra é válida para quem contribui pelo regime geral da
Previdência, o que é o caso da maioria dos educadores da rede particular e
pública.
A proposta da Reforma da Previdência inicia a
tramitação pela Câmara dos Deputados. Agora, o Congresso deverá ouvir alguns
setores da sociedade civil, como centrais sindicais, para que sejam analisadas
mudanças no texto.
Por que os docentes são um caso especial
Marta Vanelli, secretária geral da Confederação
dos Trabalhadores em Educação (CNTE), órgão vinculado à Central Única dos
Trabalhadores (CUT), opõe-se às mudanças apresentadas. “Os professores têm uma
luta histórica para conseguir ter 50% de sua carga horária para
horas-atividade. Já conquistamos um terço, o que é um grande avanço.
Entretanto, continuamos com salas superlotadas. É difícil e desgastante ficar
responsável por até cinco turmas com 40 ou 50 alunos cada. Em uma manhã, o
docente pode ter contato com até 250 crianças e adolescentes. Sem considerar
uma segunda jornada”, diz Marta. Além disso, os professores precisam
desenvolver algumas de suas tarefas fora do período de trabalho, como o
planejamento de aulas e a correção de avaliações. “Por esses motivos, nas
atuais condições, nenhum docente consegue ficar mais do que 25 anos em sala de
aula. O governo compara a idade de aposentadoria daqui com as de outros países,
mas as realidades são diferentes”.
Aumentar o tempo de trabalho dos professores
pode acarretar ainda problemas na saúde deles. O Atlas de Gestão de Pessoas
registrou que, no ano de 2012, na rede municipal de São Paulo, a quantidade de
afastamentos superou o número de docentes em sala (para saber mais, leia a
matéria de capa de NOVA ESCOLA sobre saúde mental do professor). “O governo
pensa no lado financeiro da questão, mas parece desconsiderar ou ser insensível
com as especificidades de cada profissão. O exercício de magistério acarreta
desgaste físico e mental. Por isso, as mudanças podem ampliar o número de
educadores doentes. Teoricamente, essas pessoas estão trabalhando, mas, na
prática, estão readaptadas e fora da sala de aula”, diz Claudio Fonseca,
presidente do Sindicato dos Profissionais em Educação no Ensino Municipal de
São Paulo (Sinpeem).
Sobre igualar as idades de aposentadoria de
homens e mulheres educadores, Marta também levanta argumentos contrários. “Na
cultura machista em que vivemos, além de trabalhar fora de casa, em muitos
casos a mulher é também a única responsável pela Educação e cuidado com os
filhos e com a casa. Em algumas poucas famílias, esses cuidados são divididos,
mas ainda são casos excepcionais. Se houvesse uma partilha justa de atividades
domésticas entre homens e mulheres, poderíamos pensar em igualar as idades”,
defende.
O tamanho do problema
Estima-se que, em 2017, o déficit da
previdência chegue a 181,2 bilhões de reais. Caso a tendência seja mantida,
essa conta pode fechar em 1 trilhão negativo em 2050. Com o envelhecimento da
população, estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE) preveem que, em 2060, 30% da população brasileira seja composta por
pessoas com mais de 65 anos. Nesse cenário, 20% do PIB seria gasto com a
previdência, segundo uma estimativa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
(Ipea). Em 2015, foram gastos 7,4%, com 8% da população com mais de 65 anos. Ou
seja, haverá menos pessoas contribuindo para um sistema com um número muito
maior de aposentados do que o atual. Dessa maneira, os custos dificultariam
investimentos em outras áreas, como Saúde e Educação.
Outro argumento levantado pelo governo é que a
média de idade de aposentadoria brasileira, 59,4 anos para homens (dados de
2015), está abaixo da média dos países da Organização para Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE), que foi de 64,2 anos em 2012.
Para Carlos Heitor Campani, professor de
finanças do Instituto de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o envelhecimento da população e
o aumento da expectativa de vida já eram problemas previsíveis. “Os
responsáveis pelo sistema foram extremamente negligentes ao longo do tempo e
não agiram de forma eficiente para impedir o desastre atual”, diz. O economista
defende que, em vez de se basear em outros países, o governo federal realize
uma pesquisa robusta para que as mudanças se adequem ao padrão brasileiro. Para
ele, o atual modelo e as novas propostas divulgadas até agora funcionarão
apenas como medidas paliativas. “É claro que ações corretivas tais como idade
mínima e extinção de super-aposentadorias são importantes, mas elas precisam
ser acompanhadas de outras medidas que tornem o sistema verdadeiramente
sustentável e não apenas empurrem a sujeira para debaixo do tapete, ou melhor,
para algum governo futuro”, pondera.
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