No Rio de Janeiro, menos da metade dos
colégios atende a requisitos básicos, palco das olimpíadas 2016.
BRASÍLIA E SÃO PAULO - Palco atual do torneio
mais grandioso do mundo, o Brasil está longe de uma performance olímpica quando
o assunto é a prática de esportes nas escolas. Seis em cada dez unidades
públicas de educação básica do país não contam com quadras esportivas, segundo
dados inéditos do Censo Escolar 2015. O problema atinge, em termos percentuais,
65,5% dos colégios. A proporção é levemente menor que a verificada em 2013, de
68,1%, mas ainda é considerada um sério entrave no aprendizado associado à
educação física, componente curricular obrigatório do ensino básico.
Para Priscila Cruz, do movimento Todos pela
Educação, há uma tendência equivocada de se desprezar a educação física
enquanto são favorecidas as áreas tradicionais de ensino, como linguagens,
matemática e ciências. Por esse motivo, segundo ela, os investimentos são
escassos na infraestrutura exigida para o desenvolvimento da disciplina, por
vezes encarada como mera recreação.
— Precisa ficar claro que a atividade
esportiva é fundamental para o desenvolvimento integral e bem-estar do aluno,
inclusive com evidências muito fortes que as habilidades não cognitivas, como
persistência, comunicação e trabalho em equipe têm grande impacto no
aprendizado de português e matemática — diz Priscila.
Na avaliação da ex-jogadora de vôlei Ana Moser,
que preside o Instituto Esporte Educação e o Atletas pelo Brasil, entidades
ligadas ao tema, o viés inclusivo da educação física é algo que precisa ser
resgatado nas escolas. A falta de espaços e equipamentos adequados restringe a
atividade a uma minoria de alunos que já se identifica com a vida de atleta,
segundo ela.
— A ausência grave de infraestrutura leva o
esporte nas escolas a incorporar essa visão de trabalhar só com os melhores, de
criar atletas. Quando na verdade a educação física é algo muito mais amplo. Tem
a parte física, mas também influencia outras dimensões — diz a ex-jogadora.
Pelos dados do Censo Escolar 2015, Maranhão e
Acre têm a pior situação, com mais de 90% das escolas da educação básica sem
quadra. Mato Grosso do Sul e Distrito Federal apresentam os melhores índices, e
ainda assim têm cerca de 30% dos colégios sem o espaço. No Rio de Janeiro, sede
dos Jogos Olímpicos, esse índice é de 48,5%. E São Paulo, que abriga a maior
rede pública de ensino do país, têm 37,4% de unidades carentes de quadras.
Para resolver o problema de falta de espaço,
a Escola Técnica Prof. Camargo Aranha, na Zona Leste de São Paulo, utiliza
quadras no Parque da Mooca, a 500 metros da unidade. No local, onde funciona a
subprefeitura da região, o GLOBO presenciou espaços sem redes de vôlei e
tabelas de basquete sem aro, e passou por um grupo usando drogas, às 10h da
manhã. Os alunos relatam roubos de equipamentos e objetos pessoais durante as
aulas. Há ainda uma sala onde são guardados os materiais utilizados nas
atividades, que está trancada há mais de dois meses, segundo estudantes. A
saída, relatam eles, é levar material de casa ou carregá-lo da escola para a
praça.
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O Centro Paula Souza, que administra as
Escolas Técnicas do Estado de São Paulo, informa em nota que os alunos da
Escola Técnica Prof. Camargo Aranha são acompanhados pelos professores quando
saem para as aulas por motivo de segurança, e que essa sala onde fica o
material é aberta durante as atividades. A instituição diz ainda que alguns
alunos levam bolas de casa para jogar em momentos de lazer, não para usar nas
aulas. Já a secretaria municipal de Esportes, Lazer, e Recreação disse que o
problema de usuários de drogas e de manutenção do local é responsabilidade da
segurança pública, uma vez que materiais são roubados ali. A pasta confirma que
a sala utilizada pelos alunos para guardar material está fechada e justifica
que isso se deve às constantes invasões no local.
Falta de cobertura
Mesmo em escolas que têm quadras, falta
estrutura: em 42,6% dessas, não há cobertura e, em dia de calor, o exercício é
debaixo de sol. Se chover, não tem aula. Para o aluno do Distrito Federal Lucas
da Silva Rodrigues, de 14 anos, a “pior parte” de estudar no período vespertino
é ter que ficar sem educação física quando o sol está forte. Com uma quadra
descoberta, o Centro de Ensino Myriam Ervilha, no Recanto das Emas, cidade a
cerca de 25 km de Brasília, costuma suspender as aulas no período de seca, que
está próximo de começar, por determinação da Defesa Civil.
— Aí a gente tem que ficar na sala, jogando
dominó ou fazendo alguma tarefa. É muito ruim — reclama o aluno do 7º ano.
Para outros improvisos das aulas de educação
física Lucas dá de ombros. Não se chateia em ter que passar o rodo na quadra
após as chuvas ou usar a rede de vôlei para jogar badminton, seu esporte
favorito. Ao passar pelo buraco de uma tela instalada para aparar objetos, em
busca da bola que escapou por ali, Lucas dá um salto pendurado em uma das
barras da estrutura.
Mauro Banck, diretor da unidade escolar que
atende 2,2 mil alunos do 6º ano ao 3º do ensino médio no DF, além de Educação
de Jovens e Adultos, diz que a reivindicação da cobertura na quadra é antiga. E
defende que a falta da estrutura prejudica uma série de eventos do colégio ao
longo do ano.
— Nossa feira de ciências acaba sendo dentro
das salas, que são quentes e não favorecem a circulação. Para fazer a festa
junina este ano, tivemos que providenciar lonas — conta Banck. — Se eu tivesse
uma cobertura na quadra, poderia abrir a escola para a comunidade fazer
atividades, como aulas de ginástica aos sábados, por exemplo.
Pelas normas educacionais a educação física
deve ser ministrada obrigatoriamente por professores com licenciatura, nos anos
finais do ensino fundamental (6º ao 9º ano) e no ensino médio, mas a realidade
é bem diferente nas escolas. Segundo dados do Ministério da Educação, apenas
34% dos docentes da disciplina tinham a formação adequada no ensino médio
regular do país.
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— Há professor de ciências ministrando
educação física para completar a carga horária. É ruim para o profissional e
para o aluno — diz Heleno Araújo, diretor de Assuntos Educacionais da
Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação.
Em nota, o Ministério da Educação afirmou que
a atual gestão, iniciada em maio, vai honrar “dívidas já existentes” por
considerar que “as quadras são essenciais para as atividades esportivas nas escolas
de educação básica de todo o Brasil”. O passivo, segundo a pasta, é de 3.178
quadras com obras iniciadas ou programadas, tendo sido repassado R$ 1 bilhão
para tais projetos, que demandarão mais R$ 962 milhões até sua conclusão.
Colaborou Luiza Souto
(fonte o globo )
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