Situação se agravou neste ano porque os
municípios contavam com repasse de R$ 99 bi do FPM, mas valor deve ficar em R$
84 bi.
‘Bomba
fiscal’ aguarda novas administrações
Adriana Fernandes e Idiana Tomazell/Brasília
O Estado de S. Paulo
Passado o segundo turno das eleições, a
situação financeira das prefeituras virá à tona. De 3.155 municípios que
informaram o quadro de suas finanças ao Tesouro Nacional, 2.442, ou 77,4%, já
estão com as contas no vermelho, segundo levantamento feito pela Confederação
Nacional dos Municípios (CNM). E a situação vai piorar até o fim do ano, com a
contínua queda da arrecadação, deixando a bomba fiscal para a próxima
administração.
Ao contrário dos governadores, que alardearam
nos últimos meses a crise sem precedentes nos seus cofres para ganhar mais
dinheiro do governo federal, as prefeituras empurraram os problemas para
debaixo do tapete durante a campanha eleitoral – não é exatamente um trunfo
eleitoral mostrar que as finanças estão descontroladas.
Os futuros prefeitos, que vão herdar o rombo –
no caso dos reeleitos, deles mesmos –, fizeram uma romaria nos últimos dias
pelos gabinetes do Congresso em busca de dinheiro para 2017. Mas, com o teto de
gastos já aplicado ao Orçamento federal do ano que vem, se depararam com uma
grande dificuldade em emplacar seus pedidos de emendas aos deputados e
senadores.
As informações prestadas pelos municípios ao
Tesouro não são obrigatórias. Por isso, boa parte dos 5.570 prefeitos não as
enviam. Mesmo assim, o levantamento representa o retrato mais amplo disponível
sobre as finanças das prefeituras. Ao analisar por Estados, todos os municípios
do Amazonas e do Rio que divulgaram as informações estão no negativo. Em São
Paulo, 402 prefeituras registram déficit. No Rio Grande do Sul, o quadro não é
muito diferente, com 371 cidades nessa situação.
“A bomba já estourou e vai ficar pior até o
final do ano. No período eleitoral, quem vai dizer que está mal?”, diz o
presidente da CNM, Paulo Ziulkoski. Segundo a confederação, 576 delas estão
atrasando salários.
Fundo menor
A crise se agravou porque os prefeitos contavam
com R$ 99 bilhões de repasses do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) em
2016, mas a previsão é que esse valor não chegará a R$ 84 bilhões no fim do
ano. A queda das transferências da União é mais dramática para Estados do
Nordeste e Norte do País, onde boa parte das prefeituras depende desse
dinheiro.
As prefeituras também arcam com custos cada vez
maiores com a Previdência. No ano passado, a despesa com servidores inativos
cresceu 13,22% ante 2014, segundo dados do Tesouro Nacional para municípios
acima de 200 mil habitantes. As receitas correntes, por sua vez, subiram apenas
6,81% no período.
“Só vamos saber mesmo a situação quando
sentarmos na cadeira”, diz o prefeito eleito de Brejo Grande (SE), Clysmer
Ferreira. Membro do PSB, ele era o candidato da oposição no município e esteve
no Congresso na última semana para pedir emendas aos parlamentares.
Se para os prefeitos que vão assumir os cargos
a perspectiva para o ano que vem não é animadora, para os que estão deixando o
cargo com as contas deficitárias o risco é de uma condenação por crime de
responsabilidade fiscal. Na avaliação da CNM, muitos prefeitos vão virar ficha-
suja. A Lei de Responsabilidade Fiscal proíbe uma série de práticas nos últimos
oito meses do mandato, entre elas deixar ao sucessor restos a pagar a
descoberto (sem dinheiro em caixa para honrar o pagamento).
O economista José Roberto Afonso, pesquisador
do Ibre/FGV e um dos formuladores da LRF, acredita que a sanção é correta,
desde que em situação de normalidade econômica. “Não é o caso agora. Seria
preciso encontrar uma solução que impedisse uma gastança, mas não levasse a
punições de prefeitos por fatores que são alheios à sua atuação.”
“Só vamos saber mesmo a situação quando
sentarmos na cadeira.”
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